O cenário artístico de Pernambuco e do Brasil está de luto.
Faleceu, na manhã desta sexta-feira (20), vítima de câncer, a atriz Diva
Pacheco, 72 anos. Ela estava internada no Hospital da Unimed, em Caruaru,
Agreste do Estado, e morreu por volta das 9h30. O velório de Diva acontece
nesta sexta (20/07) à tarde, na cidade-teatro de Nova Jerusálem, e o enterro
está progamado para as 9h do sábado (21).
Foto: Heudes Régis/JC Imagem
Diva Pacheco nasceu na cidade de Panelas, no Agreste de
Pernambuco. Casada com Plínio Pacheco, responsável pelo espetáculo Paixão de
Cristo, em Nova Jerusalém. Plínio faleceu em 2002. Diva fez alguns trabalhos
para o cinema, entre eles “Noite do Espantalho”, “A Compadecida” e “Batalha dos
Guararapes”. Trabalhou como diretora de arte pela TV Globo no Rio de Janeiro em
“Roque Santeiro” e em “Morte e Vida Severina”. Sua última atuação para a Rede
Globo foi em uma novela de Miguel Falabela, “A Lua Me Disse”. Teve participação
marcante em diversos concursos de fantasia, inclusive foi vencedora em muitos
deles.
Veja um texto sobre Diva Pacheco escrito por Bruno Albertim,
repórter do JC, originalmente publicado para o catálogo do Prêmio Tacaruna
Mulher deste ano, quando Diva foi homenageada:
Que nos desculpe Maysa. Mas, se o poeta Manuel Bandeira
tivesse encontrado Diva Pacheco antes, teria dito que seus olhos, e não os da
cantora poeticamente angustiada, são dois oceanos não pacíficos. Quem já teve
perto desta que é musa até na certidão de nascimento sabe: suas grandes retinas
azuis não nos deixam imunes. Parecem escrutinar, sob o comando de deuses, o
mundo. Certa feita, o jornalista Paulo Fernando Craveiro a definiu como “O
Agreste de olhos azuis”. Ou como uma “criatura tão ampla que terminou ganhando
pedaços de céu nos olhos.”
Filha de Epaminondas Cordeiro de Mendonça e Sebastiana
Lucena de Mendonça, nascida no ano da graça de 1939, Diva Pacheco parece ter
vindo ao planeta com o objetivo de não caber num rótulo só. Atriz, figurinista,
carnavalesca, artista plástica e escritora, se for objetivar um pouco. Mas Diva
é mais. Uma transgressora na vida e na arte.
Contra a vontade dos pais, casou-se, em 1956, com o gaúcho
Plínio Pacheco. Como era desquitado, algo tão inaceitável como o adultério que
ainda podia justificar, nos bancos dos réus, a absolvição de maridos assassinos
por legítima defesa da honra, a família não aprovou a união.
Quis Deus que ela não ouvisse as pequenezas de seu tempo.
Com Plínio, pôs de pé a Nova Jerusalém do Município do Brejo da Madre de Deus.
Obra que viria a constar como o maior teatro ao ar livre do mundo. Com ele,
teve também os filhos Xuruca, Nena e Robinson, todos, em maior ou menor grau,
ligados às artes e ao drama da paixão no Agreste. Além deles, consta na prole o
já falecido Paschoal. Plínio, falecido em 2002, considerava Diva nada menos que
uma remanescente das heroínas de Tejucupapo - as mulheres míticas do distrito
de Goiana que, a ferro e paus, teriam expulsado um exército holandês.
Por mais de dez anos, Diva foi a Maria da Paixão de Cristo.
“Eu entrei em Nova Jerusalém em 1962, nunca mais saí. Eu lavava roupa, engomava,
cozinhava, fazia de tudo.(…) Quase ninguém sabia ler. Tinha que ensinar o
texto, todinho, decorado. Para juntar com o elenco que vinha do Recife e eles
decoravam tudo, tudo, tudo”, recorda Diva.
Campeã superlativa de muitos Carnavais, ganhou muitos e
muitos prêmios de originalidade no Balmasqué e no Baile Municipal do Recife.
Apaixonada pela cultura de seu povo, comandou um pastoril - e desenhou o
figurino de suas pastoras. Confeccionou
tantos figurinos para cinema e teatro, que seria impossível enumerar
todos:
Batalha dos Guararapes (primeiro no teatro; depois no cinema), dos
filmes Auto da Compadecida, A Vingança dos Doze. Só na Paixão de Cristo de Nova
Jerusalém, desenhava e costurava para uma cidade praticamente inteira.
Ela também deu pitacos sobre o figurino de sua hilária
personagem Dona Sulanca, da novela global A lua me disse. O amigo Miguel
Falabela usava muito da prosódia da própria atriz para compor a personagem, uma
sulanqueira sanguinolenta de Santa Cruz do Capibaribe. “Toda vez que eu vou
para casa de Miguel , no Rio, levo um monte de comidas, coisas gostosas daqui
para ele. E ele se desembesta a gritar: ‘Ai, meu Deus...lá vem essa retirante
morrendo de medo de passar fome”, diz ela, às gargalhadas.
Mais que parceiro profissional e amigo, Falabela é virou
quase um quinto filho de Diva. Um, entre tantos exemplos, de sua capacidade de
acolher e de ser acolhida. Seja com a cumadre de Fazenda Nova, um vaqueiro do
Sertão ou com uma atriz do Leblon.
Fora dos palcos, suas roupas mantém algo de teatral. Mais
que vestimentas, molduras para mulheres pouco satisfeitas com o mais comum da
vida. Diva foi atriz do cult-movie A Noite do Espantalho (1974), de Sérgio
Ricardo. Mas também assinou o figurino do filme.
Com Diva Pacheco, a moda não é algo que cabe apenas na
vitrine ou passarela. Vai da Sulanca ao estúdio. Do palco à vida.
Publicado no JC Online.
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