Estão em tramitação no
Congresso Nacional dois projetos que prorrogam o prazo para que municípios
passem a dar o destino adequado aos rejeitos de resíduos sólidos, fechem seus
lixões e se ajustem de vez à Política Nacional de Resíduos Sólidos. A proposta que prevê o aumento escalonado do
prazo, de acordo com o porte da cidade, é bem recebida pelo governo federal
porque coloca os municípios na legalidade, como explica a diretora de Ambiente
Urbano do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Zilda Veloso.
“Apesar de não ser o ideal, se formos observar
a Política de Meio Ambiente e a Lei de Crimes Ambientais, havia uma previsão de
que os quatro anos seriam suficientes e não foram. O que a realidade nos mostra
é que quem tem mais dificuldade são os pequenos municípios. Essa proposta tem
uma concordância do Executivo porque ela cria critérios escalonados”, disse,
explicando que o outro projeto que prevê a prorrogação linear de quatro anos
seria menos justo com os municípios menores.
Para a coordenadora de
Resíduos Sólidos do Instituto Pólis, Elisabeth Grimberg, a possibilidade de
prorrogação da política é um desserviço e vai esticar seu processo de
implantação. “Não contribui para avançar na perspectiva da mudança de padrão da
gestão e destinação de resíduos. É um entrave porque quando terminar os novos
prazos, de novo os municípios vão deixando pra depois”, disse.
Os problemas na implantação
da política poderiam ser tratados de outra maneira, segundo Grimberg, com a
atuação do Ministério Público promovendo, por exemplo, Termos de Ajustamento de
Conduta junto aos municípios, estabelecendo metas e discutindo como os gestores
avançariam no gerenciamento de resíduos.
A Política Nacional de
Resíduos Sólidos foi aprovada em 2010 e determina que todos os lixões do país
deveriam ter sido fechados até 2 de agosto de 2014 e o rejeito (aquilo que não pode ser
reciclado ou reutilizado) encaminhado para aterros sanitários adequados.
O Projeto de Lei 2289/2015,
aprovado no Senado e em tramitação na Câmara dos Deputados, dá prazo até 31 de
julho de 2018, para capitais e regiões metropolitanas se adequarem; até 31 de
julho de 2019, para municípios com população superior a 100 mil habitantes; até
31 de julho de 2020, para municípios com população entre 50 mil e 100 mil
habitantes e até 31 de julho de 2021, para aqueles com população inferior a 50
mil habitantes.
Segundo a diretora do MMA,
os médios e pequenos municípios poderiam formar consórcios para construção de
aterros, mas acabaram esbarrando na falta de vontade política, falta de
técnicos locais para estar à frente dos projetos e de recursos financeiros. “A
política hoje é mais complexa, exige que exista um plano de gestão, que o que
vá para o aterro seja só rejeito, então tem que ter coleta seletiva e redução
da geração de resíduos. Mas solução não é muito fácil”, explicou.
Veloso conta que
aproximadamente 41% dos municípios já elaboraram seus planos de gestão e que
apenas 58% dos resíduos sólidos gerado nas cidades estão indo para aterros
sanitários adequados. Sem a prorrogação dos prazos, os gestores municipais que
não se adequaram à política estão sujeitos à ação civil pública, por
improbidade administrativa e crime ambiental.
Técnicas de tratamento
diferenciadas
A coordenadora do Instituto
Pólis explicou que, de todo o lixo produzido no país, 60% é orgânico, 30% é
reciclável e apenas 10% é rejeito, que precisa ir para aterro. “Existem
soluções práticas e tecnológicas, alternativas concretas de tratamento. Mas tem
muita desinformação dos gestores, falta terem maior contato com experiência em
andamento no Brasil e no mundo”, disse Grimberg, citando exemplos de
iniciativas de compostagem e biodigestão, sistemas de tratamento da matéria
orgânica.
Para ela, os gestores locais
têm insegurança de migrar do sistema de aterro para o sistema de compostagem e
/ou biodigestão, já que isso também requer um estudo em termos de orçamento.
“Falta compreender que tem que haver um remanejo, uma reapropriação dos
recursos orçamentários para ser destinados para implantar novas formas de
coleta e tratamento, como parques de compostagem e biodogestão”, disse
Grimberg.
A divulgação de técnicas de
compostagem, inclusive, é uma prioridade para o MMA, explicou a diretora Zilda
Veloso, já que a aproximadamente 51% dos resíduos sólidos gerados são resíduos
orgânicos, que nem sempre precisam ser considerados rejeito, algo que não tem
aproveitamento técnico ou econômico. Apesar disso, menos de 1% das cidades brasileiras
fazem a compostagem, segundo ela.
Além da utilização como
adubo, a compostagem reduz a periculosidade da matéria orgânica, que
normalmente gera gás e chorume, tornando-a um material inerte. “A questão
ambiental tem que ser encarada como uma economia a médio e curto prazo que os
governos federal e locais podem fazer, porque ela está ligada à qualidade de
vida e saúde das pessoas dentro das cidades, em reduzir as contas de hospital e
de recuperação de áreas contaminadas, por exemplo. Os países ricos fazem essa
conta, de reduzir os custos da gestão”, disse Veloso.
Ela explica que o MMA
oferta, sistematicamente, cursos a distância para gestores municipais, muito
focados em pequenos municípios, que são os mais carentes de informação. “E não
oferecemos só uma tecnologia, mas colocamos várias ideias necessárias para que
se melhore minimamente a gestão de resíduos”, disse Veloso.
Acordos setoriais
Outro ponto da política de
resíduos sólidos em implantação são os acordos de logística reversa. Das cinco cadeias
prioritárias, três já estão com acordos assinados: embalagem de óleos
lubrificantes, lâmpadas e embalagens em geral (plástico, metal, papelão e
vidro). As cadeias de eletroeletrônicos e medicamentos ainda discutem os termos
do acordo com o MMA.
Um dos impasses para
estabelecer a logística reversa dos eletroeletrônicos, segundo Veloso, está no
Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), cobrado pelos
estados na entrada e saída de mercadorias. “Os estados não estariam reduzindo
tributos, mas aplicando um imposto justo na entrada da comercialização. A não
cobrança do imposto sobre o resíduo descartado vai implicar em um preço mais
justo para propiciar a reciclagem”, disse, explicando que a decisão depende de
negociações com os estados.
Outra questão em debate são
os pontos de recolhimento de material descartável que, de acordo com a
classificação de resíduos, podem ser considerados locais de armazenamento de
resíduo perigoso, portanto, sujeito a licenciamento ambiental. Segundo Veloso a
questão ainda está em debate no Conama, mas o MMA propõe que produtos
minimamente íntegros, descartados pelo consumidor, não apresentam perigo.
Neste ano, o MMA deve ainda
atualizar aquelas cadeias de logística reversa estabelecidas antes da lei de
resíduos sólidos.
Inclusão de catadores
A política de resíduos
sólidos prevê também a inclusão socioeconômica dos catadores de material
reciclável, que ficariam sem fonte de renda com o fechamento dos lixões.
Segundo Zilda Veloso, apesar de não ser regra, naturalmente os municípios
deveriam ofertar para eles trabalharem na coleta seletiva e centrais de
triagem, por exemplo, assim como as empresas que fazem a logística reversa
utilizarem a mão de obra dos catadores.
“Eu acho que para os
catadores a política está sendo bem inclusiva, apesar de todas as dificuldades
desse último ano. Eles estão crescendo na cadeia”, disse a diretora, citando os
programas do governo federal Pró-catador, de inclusão socioeconômica de
catadores, e Cataforte, que repassa recursos para cooperativas e associações
desses trabalhadores.
Para Ronei Alves, da
coordenação nacional do Movimento Nacional de Catadores de Materiais
Recicláveis, os municípios não estão priorizando a política de resíduos sólidos
e nem elaboração dos planos de gestão para acessar recursos para o
gerenciamento dos resíduos. Por outro lado, ele vê com bons olhos o acordo
setorial de embalagens em geral que inclui os catadores como atores importantes
da logística reversa.
“As cooperativas e
associações podem ser ferramentas importantes no sistema de coleta seletiva e
destinação dos resíduos. Gostaríamos que os prefeitos e governadores vissem os
catadores como aliados na implantação da política”, disse Alves, contando que existem
em torno de 1,2 milhão de catadores no Brasil, incluindo aqueles que estão
trabalhando nos lixões e nas ruas.
Sistema de informações para
a população
A diretora do MMA disse que
o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos está
sendo estruturado para integrar todos os dados produzidos pelo governo federal
e pelos estados e municípios no atendimento à política nacional. “Vai ser um
grande ganho até o final de 2016 termos implantado o sistema. Isso vai dar
visibilidade a política nacional, vai fazer com que o cidadão consiga mais
informações e fique mais engajado e os próprios órgãos de governo terão uma
ferramenta eficiente para propor novas ações, como trabalhar a possibilidade de
incluir determinado rejeito na reciclagem no futuro.”
Para Veloso, apenas
aparentemente a implantação da política está devagar e logo será possível ver o
afunilamento de todas as iniciativas no efetivo cumprimento da política. É uma
política com pontos complexos e que mexe com vários atores, segundo a diretora,
como catadores, indústria, comércio, Ministério Público e, principalmente, o
cidadão. “Porque se o cidadão não fizer a parte dele a cadeia não anda. Se ele
não separar em casa o resíduo úmido do seco, como você vai fazer a coleta
seletiva? Não faz. Se o cidadão não descartar a lâmpada, o eletrodoméstico, a
embalagem de óleo no local correto, a logística reversa não via funcionar. E o
cidadão está entendendo que ele tem uma responsabilidade nessa cadeia, tudo é
um processo educativo de crescimento”, disse.
Da ABr.
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