Nas últimas semanas,
mensagens escritas e em áudio nas redes sociais – especialmente no WhatsApp –
têm criado alarme na população ao narrar cenários catastróficos sobre o surto
de zika vírus e sua relação com a epidemia de microcefalia no País.
Até 30 de janeiro, foram
notificados, segundo o Ministério da Saúde, 4.783 casos suspeitos de
microcefalia, malformação que prejudica o desenvolvimento do cérebro do bebê.
Destes, 404 casos de microcefalia foram confirmados – 17 têm ligação confirmada
com o zika vírus, os outros estão sendo investigados. Outros 709 foram
descartados e 3.670 continuam sob investigação.
O Ministério da Saúde, a
Fiocruz e especialistas consultados pela BBC Brasil explicam o que é falso, o
que é verdadeiro e o que ainda não está totalmente confirmado entre as
afirmações dessas mensagens.
Diversos boatos circulam nas
redes sociais dizendo que vacinas estragadas contra rubéola dadas a grávidas
teriam causado microcefalia. Esta informação é falsa. Primeiro grávidas não
recebem esta vacina. Segundo, de acordo com especialistas e o Ministério da
Saúde, as vacinas distribuídas pela pasta são seguras e passam por controle de
qualidade.
Também há uma outra teoria,
que partiu de um suposto estudo conduzido por um pesquisador independente
chamado Plínio Bezerra dos Santos Filho, dizendo que o problema foi a oferta da
mesma vacina – não estragada, dentro do prazo de validade – para mulheres em
período fértil – e não para grávidas, como diz o outro boato.
O Ministério da Saúde afirma
que "as vacinas dupla e tríplice viral são usadas mundialmente, e não
haveria condições de isso (malformações) ocorrer apenas no Brasil" se a
culpa fosse da imunização em período fértil. Além disso, esse
"estudo" diz que a vacina contra coqueluche, aplicada no último
trimestre de gestação, também teria influenciado no aumento dos casos. Mas,
segundo especialistas e o Ministério da Saúde, estas informações também não se
confirmam.
O ministério diz que aplica
em gestantes uma vacina contra coqueluche recomendada pela OMS e diz que ela,
na verdade, "é comprovadamente uma estratégia importante na prevenção de
adoecimento e morte de crianças pequenas". "Não há até o momento nenhuma
evidência científica nacional ou internacional que relacione o aparecimento da
microcefalia à administração da vacina dTpa (anticoqueluche) ou qualquer vacina
que faça parte do calendário nacional de imunização", afirma o órgão.
De acordo com Pedro Tauil,
infectologista da UnB, a vacina contra rubéola tem o vírus atenuado e, se
ficassem no organismo seria apenas pelo período em que a própria doença fica,
ou seja, cerca de uma semana – e não um ano, como diz o boato. A vacina contra
a coqueluche, segundo ele, também é segura e recomendada pela Organização
Mundial de Saúde.
Segundo as autoridades de
saúde, não está havendo nenhuma mudança significativa nos padrões de casos de
danos neurológicos graves em crianças – além do que, estes podem ser provocados
por vários fatores, e não necessariamente pelo vírus da zika.
"O vírus da zika e
outros, como varicela, herpes vírus, enterovírus e até dengue, podem causar
outros danos neurológicos – encefalites, cerebelites e neurites (inflamações no
sistema nervoso) –, mas no cenário atual não está havendo grande aumento desses
casos em crianças. Isso acontece talvez em 1% dos casos totais e geralmente em
pacientes com baixa imunidade", diz a neuropediatra Maria Durce Carvalho,
que acompanha casos de microcefalia e outras infecções no Hospital Oswaldo
Cruz, em Recife. "Não sei de onde vem essa informação de que crianças de
até sete anos seriam mais suscetíveis, mas não é bem assim", afirma.
Um dos áudios que circulam
no WhatsApp diz que há crianças "chegando aos hospitais já em coma"
em Pernambuco. Mas em nota sobre os boatos, a Secretaria de Saúde do Estado diz
que "não está sendo observada, em qualquer idade, mudança no padrão de ocorrência
dos casos de encefalite relacionados ao vírus da zika ou qualquer outro
vírus". "As crianças ou adultos podem apresentar diversos sintomas
neurológicos, sendo que estas complicações têm ocorrido numa frequência muito
baixa", afirma o comunicado.
O Ministério da Saúde, por
sua vez, diz que "entre pessoas infectadas pelo vírus da zika, cerca de
80% não desenvolvem sintomas, sejam adultos ou crianças. Entre essas pessoas,
apenas uma pequena parcela pode vir a desenvolver algum tipo de complicação, que
deverá ser avaliada pelos médicos, uma vez que o zika é uma doença nova e suas
complicações ainda não foram descritas".
Ao menos seis Estados do
Nordeste registraram, em 2015, aumento no número de casos registrados de
Síndrome de Guillain-Barré, uma rara doença neurológica autoimune que pode ser
provocada por diversos vírus e bactérias, incluindo o zika vírus, a dengue e a
chikungunya. A doença, que tem tratamento, provoca paralisia muscular e, em
casos graves, pode atingir os músculos do tórax e impedir a respiração.
A OMS diz que pesquisadores
estão estudando "uma relação potencial – mas não comprovada – entre surtos
de Guillain-Barré e infecções pelo vírus da zika". Segundo a organização,
sete países reportaram um aumento na incidência de casos de microcefalia e
síndrome de Guillain-Barré desde o surgimento de surtos de zika.
No Brasil, a síndrome passou
a ser registrada com mais frequência depois que foi confirmado que o vírus da
zika poderia causá-la. Normalmente, os serviços de saúde não são obrigados a
notificar ocorrências da doença para as secretarias estaduais. O governo
monitora a situação pelos registros de internações e atendimentos ambulatoriais
relacionados à doença, que revelaram aumento nos casos no ano passado em
relação a 2014.
Houve, por exemplo, 29,8%
mais internações (1.868 em 2015 ante 1.439 em 2014) e 8,1% mais atendimentos
ambulatoriais (69.703 ante 64.422). A alta foi puxada pelos Estados de Alagoas,
Rio Grande do Norte, Piauí, Bahia, Espírito Santo e Rio de Janeiro. O governo
do Rio de Janeiro anunciou que tornará obrigatória a notificação de casos, após
registrar 17 ocorrências de junho a janeiro passado.
No entanto, segundo o
ministério da Saúde, não é possível estabelecer se esses casos foram causados
pela infecção por zika, e a ocorrência de Guillain-Barré relacionada ao vírus
continua sob investigação.
"Temos visto um aumento
dos casos de Síndrome de Guillain-Barré sim, o que faz sentido, já que temos um
surto de dengue, zika e chikungunya", diz a médica pernambucana Maria
Angela Rocha, chefe do serviço de infectologia do Hospital Oswaldo Cruz, em
Recife, e parte do grupo de pesquisa sobre o zika vírus e a microcefalia em
Pernambuco. "Mas não é nada como o aumento de casos de microcefalia que
tivemos, que é muito fora do padrão."
De acordo com o vice-diretor
do Instituto de Microbiologista da UFRJ, Davis Fernandes Ferreira, a Polinésia
Francesa registrou 20 vezes mais casos de Síndrome de Guillain-Barré após o
surto de zika em 2014. "Nós estamos vivendo possivelmente um dos maiores
surtos documentados de zika vírus. Ainda estamos coletando os dados e tentando
entender a relação entre ele e a síndrome."
Alguns trabalhos científicos
internacionais identificaram a presença do vírus da zika no sêmen e no leite
materno, mas os cientistas ainda pesquisam se a doença realmente pode ser
transmitida por eles.
Na última sexta-feira (5), a
Fiocruz constatou a presença do vírus zika ativo – com potencial de provocar
infecção – na saliva e na urina, o que abriria a possibilidade de transmissão
pela via oral, ainda sendo investigada. Por enquanto, ainda não é possível
afirmar com certeza que o vírus é contagioso dessa forma. Ainda assim, a
entidade sugere a grávidas que evitem aglomerações, não compartilhem talheres
ou copos ou beijem pessoas com suspeita de zika.
No caso da transmissão
sexual, "(ela) seria possível, porque já há publicação e relato de pessoas
com quem isso aconteceu. Mas é uma situação única, porque a pessoa tem que
estar infectada, doente e ter relação exatamente nessa época. Não seria uma forma
principal de infecção, mas é importante se prevenir", diz o microbiólogo
Davis Ferreira.
Também na sexta-feira, o
Centro de Controle de Doenças dos EUA (CDC na sigla em inglês) emitiu
comunicado sugerindo que gestantes em áreas da epidemia da zika – ou cujo
parceiro viajou para áreas de risco – abstenham-se de relações sexuais
desprotegidas.
Em 2011, um estudo divulgado
na publicação científica Emerging Infectious Diseases registrou o caso de um
cientista americano que, ao voltar do Senegal, que passava por um surto de
zika, teve os sintomas da infecção em casa. Sua mulher, que não havia saído dos
Estados Unidos, foi infectada pelo vírus, o que levou à interpretação de que
ela teria sido infectada pelo sêmen do marido.
Na última terça-feira, o CDC
informou que "o laboratório do CDC confirmou o primeiro caso de zika vírus
em um não viajante." Como a pessoa infectada não havia saído do país e
estava em uma área que não tem presença de Aedes aegypti, o centro acredita que
a transmissão tenha ocorrido por contato sexual.
O vírus também foi
encontrado em amostras de leite materno de duas mães na Polinésia Francesa. No
entanto, o vírus encontrado não era do tipo replicante, que transmite a doença.
Para Ferreira, é difícil que o vírus no leite cause infecção no bebê, já que o
zika não é adaptado para a transmissão por via oral. "Transmitido pelo
leite, ele teria que passar pelo estômago do bebê, e o suco gástrico (que ajuda
a digerir os alimentos) é muito hostil", diz.
Segundo a Secretaria de
Saúde de Pernambuco, ainda não existem provas suficientes de que o vírus possa
ser transmitido pelo leite materno para que se recomende interromper a
amamentação. Além da nutrição do bebê, o leite materno é importante para
protegê-lo de doenças. Além disso, os especialistas esclarecem que, ainda que
infectado pelo vírus, o bebê recém-nascido não desenvolveria microcefalia,
porque seu cérebro já está praticamente formado.
Até o momento, não há vacina
contra o zika vírus no mundo. E o processo de desenvolvimento e aprovação de
uma pode levar até 10 anos, segundo o Ministério da Saúde. Além disso,
atualmente é difícil até mesmo diagnosticar a doença e diferenciá-la com certeza
da dengue e da febre chikungunya.
Portanto, a melhor forma de
se prevenir continua sendo evitar o contato com o mosquito Aedes aegypti, que
transmite todas elas. Além de evitar manter água parada em reservatórios sem
tampa ou em utensílios domésticos, é essencial usar repelente tanto em adultos
quanto em crianças após os seis meses de idade. Para gestantes e
recém-nascidos, recomenda-se também usar roupas longas, que deixem menos partes
do corpo expostas.
Algumas mensagens no
WhatsApp recomendam o uso de repelentes caseiros, mas, segundo os médicos, não
há comprovação de que eles sejam eficientes. Nas farmácias, há repelentes à
base de substâncias como DEET, EBAAP e Icaridina, em concentrações diferentes.
Todos eles podem ser usados por gestantes e por crianças a partir dos 2 anos.
Para as crianças, no entanto, são recomendados repelentes menos concentrados.
Os médicos recomendam passar o produto na pele e por cima das roupas,
especialmente nos horários que os mosquitos mais atacam, à noite e no início da
manhã.
Por BBC.
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